A caixa

          Seu Gregório era um homem solitário, desfrutava seus 70 anos com muito vigor. Teve dois filhos com dona Zefa, mas depois que cresceram, decidiram morar na capital baiana. Dona Zefa morreu de causas naturais quando seu Gregório completou 66 anos. Depois disso, ele passou a morar sozinho, não gostava de muitas visitas, tinha apenas a companhia de dois cachorros, um gato e três pássaros, além de seu velho amigo rádio. Ele cultivava uma pequena plantação ao redor de sua casa, no Outeiro Redondo, comunidade de São Félix, de onde tirava boa parte do seu sustento. 

    Certa vez, apareceu na sua porta um rapaz com uma áurea esquisita, vestido com uma camisa azul e amarela e uma calça azul escuro, na cabeça usava um chapéu também azul, que cobria parte do seu rosto, os sapatos pretos estavam sujos de lama. Carregava também, uma mochila nas costas, alguns papéis e uma caixa nas mãos. 

    Seu Gregório estava sentado ouvindo rádio, como costumava fazer, depois de seu almoço. Na verdade, ele estava mesmo era cochilando e tomou um baita susto quando ouviu uma voz forte o chamar. 

    –  Oh, de casa?      

    Oh, de fora  Seu Gregório responde e abre a porta para saber de quem se tratava. 

    Bom dia, senhor! O senhor é Gregório Pinto? 

    Sou eu mesmo, sim senhor. 

    Eu trouxe essa encomenda para lhe entregar. 

    E quem mandou me entregar, moço?

   Isso eu não sei, senhor. Não informa aqui o nome da pessoa.

    Tá certo, moço. Se tem meu nome, pode deixar aqui. Gradicido!

        De nada, senhor! 

    Os dois se despediram e seu Gregório entrou em casa com a caixa de cor escura e colocou em cima de uma mesa, na sala. E ali ela permaneceu por um longo período. Seu Gregório era muito sismado e não mexia no que não conhecia. Todos os dias ele acordava cedo, fazia seu café e ia tomar, fixando seu olhar naquela caixa. 

    O que será que tá aí dentro? Será que é alguma daquelas bombas que explode ou será um quente-frio? Mas quem ia mandar isso? - se pergunta ele. 

    Seu Gregório não tinha mais a companhia do rádio, não queria pegar de jeito nenhum. Era por esse veículo que ele acompanhava as horas e os noticiários. Telefone não pegava muito bem lá. Dona Zilu, que morava na cidade de São Félix, tinha um sítio perto da casa dele e sempre ia lá dar recados dos filhos e de parentes que ligavam para ela transmitir ao senhorzinho. 

    Três anos se passaram e nada de a caixa ser aberta. Até que em um domingo, ao entardecer, o senhorzinho estava sentado no seu banco de madeira na varanda, acompanhado de seus fiéis e companheiros, os dois cachorros, deitados ao seus pés, quando avistou de longe três pessoas se aproximando. Um casal de jovens com uma criança segura nas mãos. Os cães correm para atender e os receberam com fortes latidos. 

    Ciu. Rabito, Listrada, voltem. - repreende os cachorros, seu Gregório. 

      Surpresa! - grita o rapaz ainda longe da casa. 

    Seu Gregório, então, reconheceu a voz do filho Roque, acompanhado da esposa Lúcia e da filha Bela. 

    Benção pai, como tá o senhor? Dá benção seu avô, Belilnha. 

     Deus te abençoe, eu tô levando, meu filho. Oi Bela, Deus te abençoe, como você tá grande. Sua vó ia ficar feliz em te vê. Mas porque veio assim sem avisar, Roque?

       Eu tive uma folga boa no trabalho e não consegui ligar pra Zilu avisar o senhor. Então, a gente quis fazer uma surpresa. E aí, pai, o que achou do presente que lhe mandei? Já inaugurou? 

    Oxente, mas que presente? Não tô entendendo não. - questiona o senhor com ar de surpresa. 

      Pai, essa caixa que está aqui, ainda não foi aberta? Então, o senhor não gostou do que tá dentro, num foi? 

        Ah, essa caixa foi um rapaz que me trouxe, mas não disse quem mandou. Eu não quis abrir, não sei o que tá dentro. O seguro morreu de velho e aí não quis abrir. 

    Mas pai, porque teve medo? Pedia pra alguém abrir. O senhor continua com a sisma de antigamente. Vou abrir pro senhor. 

      O rapaz, abre a caixa e o pai fica radiante ao descobrir o que está nela. 

    Roque, é um rádio! Gradicido, filho, eu tava sem rádio, já tem um bom tempo que o daqui parou e eu não consegui comprar outro. O compade ficou de pegar pra consertar, mas até agora não veio. Ah, agora eu posso escutar meu o forrozinho das tardes. Dê cá, que eu vi ligar. 

    Vô, o senhor deixa eu ligar? - pergunta a neta.

      – É claro que deixo, pequena. Mas cuidado pra não quebrar o rádio do vovô. 

         E alegria voltou a reinar na casa, até Rabito e Listrada ficam felizes, abanando o rabo ao ouvir o rádio novamente. Assim, acaba a história da caixa misteriosa, ao som de muito forró. 


        

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