Arte secular cultivada por mulheres no Recôncavo

A comunidade de Coqueiros, distrito de Maragogipe, no Recôncavo Baiano, é muito reconhecida pela produção artesanal de cerâmica, que resguardam uma técnica peculiar, de origem indígena. A produção de cerâmica remonta ao período colonial, passada de geração a geração pelas mãos dos antigos artesãos e preservada, até hoje. Dentre as várias peças utilitárias produzidas, destacam-se as panelas, os tachos, as fruteiras, os fogareiros, as travessas e as frigideiras.
Os locais onde são produzidos a cerâmica é na Rua das Palmeiras e na Fazenda do Rosário, situada na entrada de Coqueiros, além desses lugares tem a Rua do Racha que é produzido fornos para torrar farinha e fazer pizza, mas lá a produção é feita por homens.
Existem aproximadamente vinte e oito mulheres trabalhando na cerâmica. Ricardina Pereira da Silva, conhecida como dona Cadu, Josefa de Jesus França, dona Zefa, Lélia Coelho Frota, Leninha e Maria Lúcia Evangelista da Silva, apelidada por Aía, estão entre as mulheres mais velhas no oficio. Os homens são em quantidade bem reduzida, apenas três lidam com louça e cerca de cinco na produção de fornos.
As mulheres trabalham sem horário determinado, cerca de dez horas por dia durante toda semana, sentadas no chão, expostas à poeira, característica do trabalho com barro, em suas próprias casas e quase sempre auxiliadas por familiares. A venda é mensal e bimestral e no período do verão ela aumenta, devido ao processo de queima das peças. A comercialização acontece por meio da associação, através da participação em eventos, como as exposições e diretamente.
De acordo com as louceiras, a quantidade de peças produzidas diariamente varia muito, peças menores, como a frigideira, fica em torno de 20 por dia, já outras como a panela, uma das mais difíceis de produzir, chega a ser produzida 15 peças por pessoa.
O barro utilizado na confecção das peças é comprado individualmente ou em conjunto e o valor da caçamba custa cerca de R$ 300,00. Essa quantidade pode durar entre sete meses e um ano, dependendo da demanda da venda. Antigamente, o barro era extraído de fazendas próximas a comunidade, mas os proprietários não aceitaram mais a retirada da terra.
As louceiras têm o apoio e fomento do Instituto Mauá, que atua na localidade há 41 anos, assegurando o escoamento da produção. Além disso, elas também contam com a Associação dos Produtores de Cerâmica de Coqueiros, que foi formalizada em 2005 e é composta por mais de 20 membros, sendo a maioria mulheres com idade superior a 45 anos de idade.
Geralmente os eventos são organizados pelo Instituto Mauá, por Universidade, como a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE-BA). Eles financiam os custos referentes às viagens e hospedagem das ceramistas, ou simplesmente louceiras. Em 2011, elas foram homenageadas num livro, intitulado “a céu aberto a louça de coqueiros” produzido pela Associação de Amigos do Museu de Folclore Edison Carneiro.

Processo para produzir peças de cerâmica

O processo de produção da cerâmica são quatro. Primeiro precisa-se do barro, que após comprado, quebra em pedaços menores e coloca na pista para os veículos amassar. Depois de amassado, ele é recolhido da pista, peneirado e molhado com água para fazer a massa de confecção das peças.
 O segundo é a confecção das peças, já sabendo que tipo de peças vai ser feita, a ceramista pega um pouco da massa e coloca sobre um pedaço de madeira, aperta com as mãos até formar o objeto, depois coloca num canto para secar. No outro dia, ela raspa o fundo do objeto, alisa com um pano úmido e coloca para secar novamente.
 Terceiro passo, depois da peça seca, é hora de fazer o burnimento (o processo que dá acabamento ao produto, com a pintura das peças), é feito pelas artesãs mais novas, por se tratar de um processo que exige maior esforço físico. Após a modelagem, as peças são secas ao sol.
 Último passo, que é o da queima dos produtos, é feito coletivamente, acontece quando as artesãs reúnem todos os produtos que precisam ser queimados e o fazem de uma vez só. Antes de ir para o fogo, as peças precisam ser passadas no sol, para não sofrer choque término. As loucas ficam empilhadas, cercadas de bumbum para pegar fogo facilmente.


Comunidade de Coqueiros é destaque no III EBECULT

Os estudantes da Universidade Federal do Recôncavo (UFRB) apresentaram dois artigos no Simpósio Temático “Cultura, Memória e Patrimônio Cultural”, realizado no prédio do IPAC, em Cachoeira, no dia 18 de abril. Um abordava a cultura da cerâmica de Coqueiros, que de acordo com a pesquisa apresentada, está perdendo espaço em Maragogipe. Isso por os jovens do local não se interessar mais por essa arte, em função de ser pouco rentável.
O estudo foi apresentado pelos estudantes Mariana de Andrade, Josenildo Júnior e Pâmela. Eles realizaram três oficinas com estudantes do ensino médio de Coqueiros, para despertar nos jovens a importância de valorizar a cultura da cerâmica e para que eles possam dar continuidade a essa arte, preservando as técnicas artesanais.
 O outro artigo foi mostrado pela estudante Sida da Silva, que destacou a possibilidade de implantar um turismo cultural no distrito, por perceber que lá têm muitas coisas que devem ser mostradas ao mundo, como o samba de roda, a gastronomia, as festas populares e a cerâmica, mas a comunidade ainda não está adequada para isso, precisa melhorar principalmente o meio de transporte. Esses estudantes fazem parte do projeto de extensão Mãos que modelam o Barro, desenvolvido pelas Profas. Lúcia Aquino e Patrícia Verônica (Museologia/CAHL).
 Além dos artigos apresentados, teve também a Vivência em Coqueiros que foi realizada no dia 19 de abril, onde as pessoas foram conhecer de perto o trabalho das ceramistas da comunidade. E quem não foi a Coqueiros, pode visitar uma exposição de cerâmicas no CAHL, que permaneceu lá durante todo EBECULT.
O III Encontro Baiano de Estudos em Cultura, (EBECULT), aconteceu em Cahoeira entre os dias 18 a 20 de abril de 2012, e teve o intuito de incentivar o compartilhamento de pesquisas desenvolvidas no campo cultural do estado da Bahia.

Texto e fotos de Valdelice Santos

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