Inseparável banco


    Pouca luz vinha ao seu encontro, mas ela não dava tanta importância a isso. Afinal, era esse tom de escuridão que lhe atraia todas as noites àquele banco.
     Suas pernas sempre cruzadas, os braços abertos sobre o branco e o olhar voltado para o céu, perdido entre a claridade das estrelas e da Lua. Ela imaginava ser a dona exclusiva daquele momento e acreditava veemente que a brisa do rio Paraguaçu vinha lhe abraçar e desejar boa noite todos os dias.
     Dona Alaide é uma simpática senhora que por nada na vida troca suas noites de descanso, sentada no seu inseparável banco, na Praça do Relógio, em São Félix. Algumas vezes chegou a dormir ali mesmo, mas ela jurava que só fechou os olhos para descansar melhor. Porém, essa senhora tem as artimanhas de nos convencer facilmente. Sabe lá se ela falou a verdade.
     Suas recordações de adolescência são suas companheiras de todas as noites. Depois que seu marido, Antonio, morreu, ela não se separou mais desse bendito banco. Um dia, por curiosidade, eu passei por perto dela para tentar descobrir o que passava em seus pensamentos. Não tive tanto sucesso de cara. Ela me descobriu e não gostou de eu está lhe observando, e entendeu que eu a via como uma velha coroca. Não pensava assim, mas nem adiantava  me explicar, ela não ia acreditar mesmo. É uma senhora difícil de ser levada na conversa.
      Eu passava todas as noites pela Praça do Relógio, para quem sabe um dia consegui desvendar esse mistério – o apego ao banco. Depois de muitas tentativas, acabei ganhando a sua confiança.     Dona Alaide me chamava sempre pra contar um pouco de sua adolescência. Então, ai que eu descobri que foi exatamente naquele banco que ela conheceu o seu Antonio, que mais tarde viera a se tornar seu esposo.
     A sua alegria reinava de volta quando ela se debruçava naquele banco e revivia todas as suas aventuras de amor de adolescente com Antonio. Seu único lamento foi de não ter vivido o amor de adulto como uma simples e feliz adolescente.

Valdelice Santos

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